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DeMoura,
A OUTRA FACE DO EDITOR
Hoje, 24 de setembro
de 2014, chegaram às livrarias dois títulos novos: O Contador de Estórias (um livro de contos) e O Escultor de Almas (um romance). Autor: um desconhecido, um tal
DeMoura. Editora: “4Estações.”
DeMoura é o
pseudónimo literário sob o qual eu resolvi publicar os livros que escrevi no
último ano. Na verdade, escrevi ainda mais um outro livro de contos (O Homem que perdeu a Sombra) e mais um romance, aliás o primeiro (O Roxo dos Jacarandás). Todos os quatro em
edições digitais, de 50 exemplares, para oferta a familiares e amigos.
O meu nome é Mário Mendes de Moura e já houve
em tempos um outro livro publicado com o meu nome, mas esse há apenas… sessenta
anos. Imaginem! Não era literatura, mas um livro apologético do campismo
desportivo, tendo batalhado bastante para a sua introdução em Portugal,
publicado na então prestigiada Biblioteca Cosmos, sob o título de O Campismo na Vida Moderna, o que muito
me envaideceu, rapaz que era com vinte e um anos.
Escrevi muitos outros
livros, em geral obras práticas ou de referência, que saíam com pseudónimos
diversos, pelas editoras que outrora dirigi, tais como a Pergaminho, a
ArtePlural, a GestãoPlus, a Bico de Pena e a Vogais & Companhia. Sim, era
editor, isto é, fui editor por sessenta anos, e é natural que alguns dos
leitores deste despretensioso blog
conheçam o meu nome, ou pessoa, já que exerci essa atividade em Portugal nos
últimos vinte anos. Anteriormente foi no Brasil, por quase quarenta anos.
Desta forma, acho que
devo uma explicação: porque pulei de editor para escritor? Mais estranho, ainda,
porquê aos noventa anos? Um esclarecimento que julgo dever aos meus possíveis
leitores e leitoras, e, principalmente, a mim mesmo. É isso
o que tentarei conseguir.
A verdade é que
sempre gostei de contar ‘estórias’ (escrevo estórias e não histórias, pois as
minhas são totalmente inventadas e não relatam acontecimentos do quotidiano ou
do passado meu ou de outros e, portanto, parece-me que não são histórias).
Em garoto, bem
garoto, talvez com uns dez anos, contava habitualmente aos meus irmãos (dois dos quais mais velhos) estórias, na hora
de adormecer. Dormíamos em quatro camas, em dois quartos, separados por uma
porta aberta entre eles, como era habitual nas moradias antigas, e eles
cobravam-me a estória. Era um ritual.
Também com essa idade
escrevia pequenos contos que enviava para a revista infantil O Senhor Doutor, que publicou alguns
deles e ainda me outorgou prémios. Qualquer dia mais folgado, irei à procura
desta prosa na Hemeroteca, para me divertir bastante.
Enquanto adulto,
imaginei, regularmente, muitos contos, romances, guiões cinematográficos, que
não passaram de apontamentos, que foram sumindo porque nunca encontrei razão
nem vontade de os desenvolver, pois a minha vida profissional e social sempre
foi muito intensa. Guardar esses esboços teria seria difícil, tendo eu vivido
em tantos países e cidades, habitado tantas casas, por maior ou menor tempo,
confortáveis ou espartanas. Situações tão diversas que me impossibilitaram de
guardar coisas de pouco interesse prático. Infelizmente, até mesmo fotografias
e cartas íntimas ficaram pelos cantos do mundo e, certamente, algumas gostaria
de reler ou rever agora. Mas sumiram na poeira do tempo.
Para mim o importante
era simplesmente imaginar as tais estórias, curtir as personagens, os diálogos
e a ação. Isso preenchia bem as minhas insónias e aborrecimentos. Com
sinceridade não me interessava minimamente partilhar com outros, pois isso
significava escrever, sacrificar o tempo para as minhas leitura e filmes,
viagens e amizades. Ver no papel, em livros ou revistas, essas fugazes e
possivelmente medíocres criações não era o meu sonho. Tão pouco, ser conhecido
como escritor.
Por incrível que
pareça, ser escritor nunca foi um dos meus sonhos juvenis sobre o meu futuro, apesar
de ser um leitor voraz e de ler bons autores. Pianista, músico, compositor,
realizador de filmes ou, ainda, alpinista ou globe-trotter, isso
sim, ambicionava com entusiasmo.
Afinal os caminhos
foram muito diferentes dessas minhas aspirações. Cursei Silvicultura,
certamente em razão da minha forte paixão pelas árvores e pela natureza. Um
erro colossal! Mas como saber a minha real vocação e predicados? Ninguém, então, nos orientava cientificamente e nós, e nossos
pais, dispúnhamos de muito pouca informação para acertar.
Esse erro e a minha
militância antissalazarista levaram-me para o único caminho possível: emigrar.
Sim, emigrei, comi as papas do Diabo na Venezuela e no Canadá, e também, de
início, no Brasil. Finalmente este país proporcionou-me melhores oportunidades.
O certo é que nesse, então, maravilhoso país, eu, com apenas 29 anos, criei uma
editora de livros, do zero, zero absoluto, com dois sócios que, como eu, nada
entendiam da parte editorial (um médico e o outro gráfico).
Durante dois anos, ocupei-me
não só da parte editorial como da comercial, aprendi muito de artes gráficas
com o meu sócio gráfico, aprendi muito das outras vertentes no próprio mercado,
que palmilhei com muito esforço e com atenção e curiosidade. Bom, mais tarde, aqui
neste blog, penso voltar à minha trajetória editorial.
Importa apenas dizer,
agora, que de 1953 até 2010 sempre fui proprietário, único ou sócio, de
diversas editoras, e de que a direção editorial delas sempre foi exclusivamente
minha. Dessas editoras vivi, melhor ou pior, criei os meus quatro filhos, bebi
o meu uísque e viajei muito. E fui muito feliz, pois nunca duvidei que, para
mim, uma editora é o melhor negócio do mundo, desde que amemos a atividade e
tenhamos bastante criatividade e muita, mesmo muita, paciência e fair play.
***
Meu amigo, mais que criatividade e fair play , sempre teve de sobra talento (muito) e dedicação .
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